O cenário econômico internacional que se desenha ao final deste ano de 2008
coloca no centro da agenda mundial o debate acerca do papel das autoridades
reguladoras e supervisoras do sistema financeiro internacional. Revisitando o
contexto do arcabouço de governança dos mercados financeiros concebido pelo
Acordo de Bretton Woods e as premissas que vêm orientando boa parte das
ações dos órgãos de regulação, a produção acadêmica vem ganhando renovado
fôlego para fornecer contribuições para a evolução do debate.

Fiel a seus propósitos de divulgar trabalhos jurídicos relacionados com as áreas de atuação do Banco Central do Brasil e de estimular o estudo, a reflexão e a investigação de temas relacionados ao Direito Econômico da Regulação Financeira, o número 2 do volume 2 da Revista da PGBC, ora apresentado, traz artigos e manifestações jurídicas acerca de temas sensíveis nessa seara. São discutidos os preceitos norteadores da regulação bancária, enfrentando questões polêmicas como a disciplina dos contratos bancários, a função social do sistema financeiro e a responsabilidade das instituições que o compõem. No prisma internacional, são discutidos assuntos igualmente importantes, como os mecanismos de compartilhamento monetário e os sistemas de pagamentos em moedas locais.

Abrindo a seção de artigos, na qualidade de colaborador externo, João Alves Silva, do Banco do Brasil, brinda-nos com um estudo, em espanhol, sobre os contratos bancários, que foi desenvolvido no âmbito do programa de Doutorado em Direito da Universidade Nacional de Buenos Aires (UBA), na área de advocacia preventiva nas relações de consumo. O autor analisa as peculiaridades desse tipo de relação contratual, identificando as tensões, os conflitos e o impacto da tecnologia sobre a dinâmica das relações entre instituições financeiras e seus clientes.

Em seguida, Maria de Fátima Cavalcante Tosini, Elvira Cruvinel Ferreira Ventura e Luciana Graziela Araújo Cuoco, analistas do Banco Central, investigam de que maneira as políticas de responsabilidade socioambiental dos bancos podem ser indutoras do desenvolvimento sustentável. As autoras contextualizam essas iniciativas no ambiente dos movimentos sociais e ambientais, traçando um histórico do envolvimento dos bancos com tais questões, no Brasil e no mundo.

O tema da justiça social é abordado por Flávio José Roman, Procurador do
Banco Central, que analisa a incidência e a eficácia das normais constitucionais
de justiça social na regulação do sistema financeiro nacional. Após destacar
algumas normas de cunho social firmadas na Carta Magna, o procurador
demonstra sua aplicabilidade com precedentes do Supremo Tribunal Federal e
aborda sua incidência nas leis e normas infralegais de fomento ao microcrédito.

Na busca de bases mais concretas para a solução jurídica de casos práticos,
principalmente em questões de cunho econômico, Leandro Sarai oferece sua
perspectiva acerca do conceito de direito adquirido. Após uma revisão de
literatura acerca do conceito corrente, Leandro propõe algumas bases para
identificar o que de fato atribui a qualidade de “adquirido” a um direito.

Em nova contribuição para a revista, Marlos Lopes Godinho Erling defende o pleno uso do Sistema Bacen Jud, sustentando a ilegalidade e a inconstitucionalidade da imposição, ao exeqüente, por órgãos jurisdicionais, do ônus de demonstração do esgotamento de diligências, de ordem extrajudicial, como requisito para a utilização do referido sistema. Recorrendo ao exame da legislação processual em vigor, Marlos assevera que a penhora de dinheiro teve sua juridicidade reforçada pelas recentes reformas legislativas, sobretudo porque garante a eficácia do direito fundamental à tutela jurisdicional adequada, efetiva e tempestiva, nos termos da Constituição da República, sem que haja violação ao direito fundamental de sigilo bancário.

No plano dos temas internacionais, Guilherme Centenaro Hellwig investiga o papel desempenhado pela defesa e a promoção da concorrência na busca da construção de um ambiente comunitário europeu no qual os agentes econômicos possam se movimentar livremente, em um mercado interno único. O autor examina a importância das autoridades européias na consolidação do mercado bancário único europeu, estudando como o Tribunal de Justiça das Comunidades Européias e a Comissão Européia contribuíram para uma efetiva implementação das regras concorrenciais comunitárias no setor bancário do Velho Continente. Jefferson Siqueira de Brito Alvares trata dos mecanismos de compartilhamento monetário, que, segundo retratado por ele, servem à função de angariar credibilidade à política econômica, mediante a renúncia ao exercício da política monetária pelas autoridades nacionais, além de permitir a redução de custos de transação no comércio internacional associados à existência de padrões monetários diversos.

Por fim, Danilo Takasaki Carvalho apresenta os principais aspectos jurídicos
do Sistema de Pagamentos em Moeda Local (SML), operado pelos bancos centrais
do Brasil e da Argentina desde outubro de 2008. Para tanto, ele examina os textos
normativos editados pelas diversas instituições envolvidas com a criação do
sistema, à luz da literatura jurídica e econômica sobre o assunto e de informações
existentes em processos administrativos arquivados no Banco Central.

Na seção de pronunciamentos, foram selecionados pelo Conselho Editorial
dois pareceres que serviram de base a informações prestadas pelo Banco
Central ao Superior Tribunal de Justiça para julgamento de causas pertinentes
à limitação de juros remuneratórios e comissão de permanência, além de
parecer sobre um projeto de lei que se propõe a fixar critérios para a incidência
de juros progressivos de acordo com o número de recursos interpostos, como
forma de coibir o manejo da via recursal para fins protelatórios. Além disso, são
publicadas duas peças de contestação apresentadas pelo Banco Central em ações
civis públicas, uma buscando a declaração de ilegalidade da cobrança de tarifa
pela emissão de cheques de pequeno valor e outra buscando o reconhecimento
judicial da obrigação do Banco Central de fiscalizar as administradoras de cartão
de crédito.

Brasília, 30 de dezembro de 2008.
Fabiano Jantalia
Editor da Revista da PGBC

Publicado: 2010-03-15