Revista da Procuradoria-Geral do Banco Central
v. 4 n. 2 (2010)

Já se disse que o Brasil é um país carente de ideias. Porém, é difícil imaginar
algo mais distante da realidade. Ideias criativas e originais são pensadas todos os
dias nos órgãos públicos, nos escritórios de advocacia e mesmo no recesso dos
lares. Apesar disso, um fenômeno estranhamente brasileiro consiste em guardar
as ideias para si ou utilizá-las apenas como ferramentas de trabalho.


O dia a dia de qualquer órgão jurídico demonstra isso de maneira cristalina:
a toda hora, milhares e milhares de boas ideias são circunscritas ao restrito
universo das petições e dos pareceres. Sem qualquer falsa modéstia ou mesmo
vanglória, aqueles poucos que se dignam a publicizar suas ideias dão uma
contribuição inestimável ao, este sim, empobrecido debate cultural brasileiro.


Esta é a função de qualquer revista jurídica: enriquecer o panorama cultural
do País, trazendo uma nova abordagem para a resolução de novos e antigos
problemas. Com orgulho, a Revista da Procuradoria-Geral do Banco Central
tem cumprido essa missão desde 2007, quando, em dezembro, foi lançada a
primeira edição. São exatamente quatro anos de contínua dedicação à alta
cultura jurídica brasileira. Em todas as edições, cada artigo, cada manifestação
jurídica trouxe o germe de inovações políticas, legislativas, administrativas,
judiciais e, quiçá, constitucionais.


Nesta edição, o primeiro artigo (A Loteria Judicial) foi escrito pelo procurador
Edil Batista Junior, que aborda corajosamente um dos temas mais sensíveis da
atualidade: a liberdade de que os magistrados devem dispor para interpretar e
aplicar a lei. O autor desconstrói vários mitos ainda persistentes no imaginário
jurídico brasileiro, como os dogmas da completude e da inequivocidade dos
textos legais, demonstrando que a norma jurídica é, necessariamente, construída
não apenas pelo legislador, mas também pelo juiz.


A atuação do Poder Judiciário continua a ser analisado no artigo seguinte (O Ativismo Judicial e um Novo Marco Jurídico-gerencial Democrático), de autoria do advogado da União Juliano Ribeiro Santos Veloso. Ele identifica o ativismo judicial com a expansão dos direitos previstos constitucionalmente, mas garantidos de maneira insuficiente pelo Legislativo e pela Administração Pública. Trata-se de uma expansão dos limites do Direito, que passa a contar cada vez mais com a participação de novos atores na construção das normas jurídicas.


Pode parecer natural que advogados públicos reflitam sobre seu maior cliente:
o Poder Judiciário. Sendo, porém, integrantes da estrutura da Administração
Pública, torna-se imperioso a compreensão crítica de seu próprio lugar de
atuação. Não se furtam desse desafi o os autores dos próximos artigos.


Rui Magalhães Piscitelli, procurador federal, disserta sobre O Direito
Fundamental a uma Administração Pública Constitucionalizante. De forma
inovadora, ele propõe que, sendo apenas exemplifi cativa a enumeração
constitucional de direitos fundamentais, deve ser considerada, como direito
fundamental, a conformação da Administração Pública aos princípios
constitucionais, tornando-a mais um instrumento de plena realização do
princípio da dignidade humana.


Em seguida, Meire Lúcia Monteiro Gomes Mota Coelho, procuradora federal,
e Magda de Lima Lúcio, professora da Universidade de Brasília, escrevem
Litigiosidade e Impacto na Gestão Pública – A Mediação como Instrumento de
Gestão – A experiência da Câmara de Conciliação e Arbitragem da Administração
Federal. Trata-se de um trabalho em três passos: uma profunda análise do
impacto que a crescente litigiosidade tem sobre o Estado; considerações sobre os
fundamentos teóricos da mediação e conciliação como instrumentos de gestão
no contexto da Administração Pública federal; e, fi nalmente, a apresentação da
experiência da Câmara de Conciliação e Arbitragem da Administração Federal
(CCAF), órgão da Consultoria-Geral da União.


O próximo artigo demonstra, mais uma vez, a necessidade da mediação na Administração Pública e o que pode ser feito para aperfeiçoar esse instrumento. A autora, Luciane Moessa de Souza, procuradora do Banco Central, dedicou-se a propor aprimoramentos no processo administrativo sancionador da autarquia, defendendo a regulamentação do tema por meio de resoluções do Conselho Monetário Nacional e a necessidade de gerenciamento coletivo de demandas repetitivas, além de analisar questões relevantes envolvidas na celebração de termos de ajustamento de conduta. Em uma revista editada por um banco central, é inevitável a existência de artigos envolvendo a legislação bancária. A novidade desta edição é exatamente a legislação estudada: a russa. Alexei Guznov, vice-diretor do Departamento Legal do Banco da Rússia, e Tatiana Rozhdestvenskaya, professora de Direito em Moscou, descrevem a legislação bancária russa atual, suas origens e suas perspectivas. Trata-se de oportunidade única de compreender o sistema financeiro de um país que, como o Brasil, é considerado uma das grandes potências emergentes do século XXI. A procuradora do Banco Central Kátia Cilene de Carvalho fecha a sessão de artigos com um trabalho de nome injustamente modesto: Breves Anotações sobre a Declaração de Capitais Brasileiros no Exterior. O que torna a modéstia injusta, neste caso, não é apenas a abrangência do trabalho, mas, principalmente, seu ineditismo: trata-se, provavelmente, do primeiro artigo jurídico a tratar em profundidade desse tema, cuja análise costuma fi car restrita aos burocratas e economistas. Tornar-se-á, indubitavelmente, uma obra que referência aos juristas que futuramente estudarem o assunto. A sessão seguinte conta com manifestações jurídicas da Procuradoria-Geral do Banco Central do Brasil que foram selecionadas em razão de sua relevância: dois pareceres e duas petições. Os pareceres referem-se: às inovações, propostas no anteprojeto de novo Código de Processo Civil, relativas ao regime legal de penhora de dinheiro em depósito ou em aplicação fi nanceira; e à defesa, em mandado de segurança, da legalidade do indeferimento do pedido de constituição de pessoa jurídica para operar em mercado de câmbio, baseada na ausência do requisito “reputação ilibada”. As petições tratam de: requerimento de ingresso em feito como amicus curiae com as fi nalidades de explicitar o que é o Sistema de Solicitações do Poder Judiciário ao Banco Central (Bacen Jud) e expor as razões que evidenciam sua legalidade.; e de reclamação, dirigida ao Supremo Tribunal Federal, contra decisões que consideraram intempestivos os embargos à execução opostos pelo Banco Central, ajuizados no prazo fi xado no art. 1º-B da Lei nº 9.494, de 10 de setembro de 1997.



Alexandre Magno Fernandes Moreira Aguiar
Procurador do Banco Central.
Editor-Chefe da Revista da
Procuradoria-Geral do Banco Central.

Revista da Procuradoria-Geral do Banco Central
v. 4 n. 1 (2010)

A Procuradoria-Geral do Banco Central do Brasil (PGBC) sempre foi um
centro produtor de vasto conhecimento jurídico, tendo atuado nos processos
mais decisivos das últimas décadas da história brasileira. Infelizmente, toda essa
informação raramente era compartilhada com a comunidade jurídica.


A Revista da Procuradoria-Geral do Banco Central surgiu exatamente para
suprir essa lacuna, tendo como objetivo disseminar a cultura jurídica produzida
internamente. Este número da publicação conta com cinco excepcionais artigos
escritos por procuradores do Banco Central, além de quatro pronunciamentos
da própria PGBC, que representam a excelência do trabalho aqui produzido.


Há, também, outro objetivo fundamental da revista: valorizar a produção
jurídica referente a temas de interesse da PGBC, onde quer que seja produzida.
Nesse sentido, são apresentados três artigos de relevo que tratam, juridicamente,
de temas econômicos, fi nanceiros e trabalhistas.


A seção de artigos é aberta pelo brilhante trabalho do procurador Jamacy
José da Silva, que traça um panorama do princípio da efi ciência, de aplicação
ainda problemática na Administração Pública, fazendo uma conexão com a
Gestão de Projetos e, mais ainda, com sua aplicação na PGBC. Demonstra, na
prática, como a Gestão por Projetos pode representar um ótimo instrumento de
concretização do princípio da efi ciência.


Ainda com abordagem principiológica e inovadora, o procurador César
Cardoso contribui para a exata compreensão do conhecidíssimo princípio da
moralidade, que, apesar de muito citado na doutrina e na jurisprudência, tem
um signifi cado por demais aberto, o que deixa, muitas vezes, sua concretização
submetida aos caprichos e visões pessoais do operador jurídico. A novidade da
abordagem é a aplicação da fi losofi a utilitarista, segundo a qual a atitude correta
é aquela que busca a maior felicidade para o maior número de pessoas.


Já a advogada Selma Oliveira Silva dos Santos analisa uma das questões mais controvertidas da Administração Pública, qual seja, a responsabilidade subsidiária da entidade pública por débitos trabalhistas de terceirizados. A Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST) é detidamente questionada, com especial ênfase em seu confronto com o art. 61 da Lei 8.666, de 21 de junho de 1993, que exclui qualquer responsabilidade do ente público por dívidas do contratado.


A análise crítica de atuais questões trabalhistas mantém-se com o artigo do
procurador Valdinei Tomiatto, que discorre sobre a arbitragem e sua utilização
no Direito Individual do Trabalho. Como no artigo anterior, a adequação
constitucional do instituto (no caso, a arbitragem) é detidamente analisada e
confi rmada. Também são comentadas decisões do TST a respeito do assunto,
sendo concluída a perfeita viabilidade da aplicação da arbitragem aos confl itos
individuais do trabalho.


A procuradora Conceição Maria Leite Campos Silva analisa uma das questões que mais geraram controvérsia na atuação do Banco Central: a utilização do sistema Bacen Jud para a constrição judicial de contas bancárias. Esse sistema elimina a necessidade de o juiz enviar documentos (ofícios e requisições) na forma de papel para o Banco Central, toda vez que necessita afastar sigilo bancário ou ordenar bloqueio de contas-correntes de devedores em processo de execução, para posterior penhora. Também é analisada a Ação Direta de Inconstitucionalidade 3.091/DF, que arguiu a inconstitucionalidade desse sistema.


A procuradora Viviane Neves Caetano também dá sua contribuição em um ponto dos mais polêmicos na doutrina e na jurisprudência: a aplicação do princípio da retroatividade da norma penal mais benéfi ca ao Direito Administrativo Sancionador. Essa questão é analisada tendo como referência diversas normas administrativas que, em determinadas épocas, impunham pesadas multas a importadores. Com base nesses elementos, verifi ca de forma inovadora o caráter de ultra-atividade que necessariamente envolve as normas cambiais.


Na seara econômica, Camila Villard Duran, doutoranda na Universidade de
São Paulo, analisa decisões relevantes do Supremo Tribunal Federal relativas aos
planos econômicos de estabilização (do Plano Cruzado ao Plano Real) e traça as
linhas argumentativas utilizadas nessas decisões. Ao fi nal, o artigo traz o conceito
de lei monetária e os contornos da moldura jurídica do poder monetário, tal
como formulado pelo Supremo em suas decisões sobre planos econômicos.


Fechando a seção de artigos, Bruno Meyerhof Salama, professor da Fundação
Getulio Vargas, investiga, de forma interdisciplinar, as inovações fi nanceiras,
especialmente os contratos indiretos, e o modo como o Direito tratou desse
fenômeno no decorrer do tempo. De forma crítica, verifi ca a crescente
administrativização do Direito Bancário e a consequente perda de espaço
jurídico para as inovações fi nanceiras.


A seção seguinte, relativa aos pronunciamentos da PGBC, traz uma peculiaridade digna de nota: o Parecer 350, que, apesar de ter sido escrito em 2004, mostra-se absolutamente atual. A razão dessa atualidade é o tratamento inovador dado à polêmica acerca da existência de responsabilidade subsidiária de entidades públicas em razão de contratos de terceirização de mão de obra. A demonstração cabal da inexistência dessa responsabilidade, realizada no referido parecer, serviu de base para a gradual mudança de orientação da jurisprudência no sentido orientado por ele.


Esta edição da revista ainda conta com as seguintes manifestações jurídicas da
PGBC: um relatório sobre a atuação da autarquia no combate à crise fi nanceira;
um parecer sobre o efeito que deve ser dado aos recursos contra as decisões do
Banco Central do Brasil proferidas por violação à Lei nº 9.613, de 3 de março
de 1998; e duas petições: a primeira, a manifestação do Banco Central como
amicus curiae na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental
nº 165-0/DF, relativa à constitucionalidade dos planos econômicos adotados
entre 1986 e 1991; a segunda, uma ação civil pública ajuizada com o objetivo
de obrigar a autarquia a informar previamente o consumidor da inclusão de
quaisquer informações a seu respeito na Central de Risco de Crédito (CRC).



Brasília, 30 de junho de 2010.
Alexandre Magno Fernandes Moreira Aguiar
Editor-adjunto da Revista da Procuradoria-Geral do Banco Central.
Coordenador-substituto do Centro de Estudos Jurídicos.


 

Revista da Procuradoria-Geral do Banco Central
v. 3 n. 2 (2009)

A presente edição da Revista da Procuradoria-Geral do Banco Central traz
um precioso conjunto de trabalhos que abordam temas de grande interesse
daqueles que militam ou têm interesse na regulação do sistema fi nanceiro
nacional e internacional. Rompendo mais uma vez as fronteiras institucionais,
e fiel ao propósito de viabilizar e estimular o debate científi co acerca dos temas
relacionados à área de atuação do Banco Central, a revista que vai adiante veicula
nada menos do que quatro artigos de autores que não integram os quadros da
autarquia. A qualidade dos artigos e a diversidade dos autores contemplados
nesta edição revelam a maturidade deste periódico, além de evidenciar seu
caráter fundamentalmente acadêmico, a despeito de sua vinculação funcional.


Abrindo com maestria a seção de artigos, o professor Benjamin Cohen, da
Universidade da Califórnia (EUA), nos brinda com suas refl exões sobre a relação
de causalidade existente entre o caráter internacional da moeda e o poder ao
Estado que a emite. O ensaio do professor é objeto de resenha do procurador
Jeff erson Siqueira de Brito Álvares, um competente e dedicado pesquisador
acerca da regulação fi nanceira internacional, que tece comentários bastante
elucidativos e de grande relevância para a contextualização e compreensão do
texto do professor Cohen.


No artigo seguinte, o acadêmico Fernando dos Santos Lopes apresenta uma
análise interessante da teoria dos fatos institucionais, desenvolvida pelo fi lósofo
John Searle. O autor sustenta, em especial, que uma instituição somente pode ser
considerada enquanto tal na medida em que cumpre suas fi nalidades essenciais
relacionadas à satisfação das necessidades humanas.


Promovendo uma releitura da doutrina do state action ou imunidade Parker v. Brown, Roberto Domingos Taufi ck, do Cade, aborda, de maneira inovadora, a relação entre concorrência e regulação. Abordando dúvidas construídas ao longo de mais de uma década da aplicação do instituto, no Brasil, o pesquisador se dedica a uma análise da relação dicotômica entre a natureza da atividade de órgãos de Estado – como o próprio Cade – e a premência da implementação de políticas públicas instrumentalizadas pelas agências reguladoras.


Em seguida, o procurador Danilo Takasaki Carvalho discorre sobre o
contrato de correspondente bancário, contrastando a técnica empregada
pelas autoridades reguladoras do mercado de correspondentes com a prática
contratual estabelecida nesse mercado pelas instituições autorizadas a funcionar
pelo Banco Central do Brasil. O autor conclui, a propósito, que o efetivo alcance
dos objetivos da regulação mostra-se dependente do comportamento dos
correspondentes, o que revela a importância do contrato que esses celebram com
as instituições autorizadas pela autarquia.


O advogado e pesquisador Henrique Haruki Arake Cavalcante nos traz
então um consistente estudo dos contratos derivativos futuros negociados no
Brasil. Após a apresentação do arcabouço jurídico acerca da matéria, o trabalho
contempla a investigação de como o mercado e seus participantes descrevem sua
dinâmica, identifi cando sua natureza jurídica e seus traços peculiares.


Com base na doutrina e na legislação pátrias, Leandro Sarai, procurador
do Banco Central, analisa a aplicabilidade dos elementos ensejadores da
responsabilidade civil ao BCB. Após breves considerações acerca da teoria geral
da responsabilidade civil e da explicitação de um conceito geral, o autor sustenta,
por exemplo, que, nos casos de omissão, somente haverá responsabilidade civil
do BCB se, além de existir previsão legal impondo o dever de agir, houver,
atrelado ao descumprimento desse dever, expressa previsão determinando o
dever de reparar.


Encerrando a seção de artigos, o também procurador Marlos Lopes Godinho Erling aborda o tema da execução provisória contra a Fazenda Pública. Além de apresentar as características, similitudes e distinções entre as técnicas processuais pertinentes à efetivação da tutela antecipada e a execução provisória contra a Fazenda Pública, o procurador, após recorrer a um estudo de caso, conclui que a vedação à execução provisória contra a Fazenda Pública cinge-se a obstar a expedição do precatório ou requisição de pequeno valor antes do trânsito em julgado da decisão de mérito.


Por fim, a seção de pronunciamentos jurídicos desta edição da Revista da
PGBC conta com três pareceres e uma petição que abordam temas extremamente
intrigantes e controvertidos. Os pronunciamentos ora publicados empreendem
consistentes análises do sigilo bancário, do cadastro positivo e da polêmica
acerca da limitação jurisprudencial das taxas de juros, além de se discutir acerca
do regime jurídico que deve ser aplicado às operações realizadas pelo BCB na
administração das reservas internacionais.


 


Brasília, 31 de dezembro de 2009.
Fabiano Jantalia
Editor da Revista da PGBC.

Revista da Procuradoria-Geral do Banco Central
v. 3 n. 1 (2009)

A edição que se apresenta da Revista da PGBC possui a marca da evolução que a Procuradoria-Geral vem buscando imprimir ao periódico. Em continuidade aos valiosos trabalhos já publicados em edições anteriores, o presente número contempla artigos inovadores, quer em relação aos temas, quer em relação à abordagem por eles adotada, debatendo temas de grande relevância para o sistema financeiro nacional.


A seção de artigos é iniciada com uma consistente e inovadora contribuição do Professor Marcus Faro de Castro, da Universidade de Brasília, que propõe novas bases para a investigação científica na conturbada fronteira entre o Direito e a Economia. Em seu artigo, o pesquisador argumenta que as abordagens jurídicas de questões economicamente relevantes não têm contribuído para superar essa dificuldade. Discutindo a importância da moeda como instituição social complexa envolvida na promoção da liberdade e a caracterização da economia de mercado como sendo formada por agregados contratuais com componentes reais e monetários, o autor propõe o emprego de uma abordagem interdisciplinar para a elaboração de critérios derivados de análises empíricas e destinados a compatibilizar o dinamismo transformativo da economia de mercado com a equânime fruição de direitos humanos e fundamentais.


Em seguida, o procurador Danilo Takasaki Carvalho apresenta, sob a forma de artigo, um importante relato das palestras e debates que tiveram lugar na I Conferencia Latinoamericana de Arbitraje, realizada em Assunção, Paraguai, no mês de junho de 2009. O artigo aborda questões de natureza prática relativas à adoção da arbitragem como mecanismo de solução de controvérsias entre o Banco Central do Brasil e suas contrapartes em contratos internacionais e discute as vantagens da arbitragem institucional, as medidas de urgência em procedimentos arbitrais, a mediação como etapa prévia à arbitragem e a redação da cláusula compromissória em relações jurídicas de múltiplas partes.


O procurador José Eduardo Ribeiro de Assis nos brinda com um pragmático estudo acerca da evolução de um financiamento imobiliário em uma economia com altas taxas de infl ação. A partir da análise de um caso concreto, no qual o pagamento de todas as prestações não foi suficiente para extinguir a dívida, o procurador analisa todas as variáveis envolvidas, como taxa de juros, índices de correção e sistemas de amortização, de forma a procurar identificar a causa das distorções detectadas ao final do financiamento, sustentando que o problema do financiamento não reside na adoção do sistema Price, mas sim na disparidade de períodos de reajuste do saldo devedor e das prestações ajustadas.


Analisando o posicionamento da Procuradoria-Geral do Banco Central e pelo Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional acerca do significado da expressão “irregularidades pendentes de julgamento definitivo nas instâncias administrativas”, contida no art. 126 da Lei nº 11.196, de 21 de novembro de 2005, o procurador Lucas Alves Freire promove um relato histórico da multa de importação, realçando as implicações da sucessão temporal de leis penais para a aplicação das referidas multas. A partir disso, o autor analisa as dúvidas e as interpretações conflitantes acerca do tema em matéria de processos sancionadores no âmbito do sistema financeiro nacional.


Ainda na seara de processos administrativos punitivos, os procuradores Marcel Mascarenhas dos Santos e Marlos Lopes Godinho Erling discorrem sobre o relevante e controvertido tema da reformatio in pejus. Enquanto o primeiro autor discute o tema com foco no estudo de caso concreto decidido pelo Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional, o segundo autor se vale


de uma análise sistemática da vedação à reformatio in pejus no âmbito do Direito Processual Civil e do Direito Processual Penal, em que a instância recursal é aberta por iniciativa exclusiva da parte interessada. Nesse sentido, sustenta a tese de que a mera previsão de oportunidade de manifestação anterior do administrado à possível decisão de agravamento em sede recursal administrativa viola os princípios do contraditório e da ampla defesa nas vertentes do direito de manifestação.


No trabalho seguinte, a advogada Sara Moreira de Souza estuda a sonegação fiscal como crime antecedente de lavagem de dinheiro à luz da Lei nº 9.613, de 3 de março de 1998, e do Projeto de Lei nº 3.443, de 16 de junho de 2008. A autora argumenta que, se o projeto de lei em questão for aprovado, não haverá mais um catálogo de crimes antecedentes e, assim, o delito de sonegação fiscal, em qualquer de suas modalidades, praticado por organização criminosa ou não, poderá ser considerado crime prévio de lavagem de dinheiro.


Fechando a seção de artigos, o procurador Jamacy José da Silva Junior apresenta um interessante artigo em que examina a divergência de posicionamento dos tribunais superiores no que se refere à intempestividade ante tempus dos recursos. Em seu estudo, o procurador propõe bases conceituais para diferenciar o recurso prematuro do recurso antecipado, analisando o posicionamento dos tribunais superiores sobre o tema.


Para engrandecer ainda mais a edição, o Conselho Editorial da Revista da PGBC selecionou quatro pronunciamentos importantes elaborados pela Procuradoria-Geral. Além da análise do acordo de swap de moedas entre o Banco Central do Brasil e o Federal Reserve Bank of New York, foram também selecionados pronunciamentos que discorrem sobre o Bacen Jud, a capitalização mensal de juros em contratos bancários e os planos de estabilização monetária denominados Cruzado, Bresser, Verão, Collor I e Collor II. Diante disso, esperamos que a leitura dos trabalhos ora publicados seja bastante proveitosa.


Brasília, 30 de junho de 2009.


Fabiano Jantalia


Editor da Revista da PGBC.

Revista da Procuradoria-Geral do Banco Central
v. 2 n. 2 (2008)

O cenário econômico internacional que se desenha ao final deste ano de 2008
coloca no centro da agenda mundial o debate acerca do papel das autoridades
reguladoras e supervisoras do sistema financeiro internacional. Revisitando o
contexto do arcabouço de governança dos mercados financeiros concebido pelo
Acordo de Bretton Woods e as premissas que vêm orientando boa parte das
ações dos órgãos de regulação, a produção acadêmica vem ganhando renovado
fôlego para fornecer contribuições para a evolução do debate.


Fiel a seus propósitos de divulgar trabalhos jurídicos relacionados com as áreas de atuação do Banco Central do Brasil e de estimular o estudo, a reflexão e a investigação de temas relacionados ao Direito Econômico da Regulação Financeira, o número 2 do volume 2 da Revista da PGBC, ora apresentado, traz artigos e manifestações jurídicas acerca de temas sensíveis nessa seara. São discutidos os preceitos norteadores da regulação bancária, enfrentando questões polêmicas como a disciplina dos contratos bancários, a função social do sistema financeiro e a responsabilidade das instituições que o compõem. No prisma internacional, são discutidos assuntos igualmente importantes, como os mecanismos de compartilhamento monetário e os sistemas de pagamentos em moedas locais.


Abrindo a seção de artigos, na qualidade de colaborador externo, João Alves Silva, do Banco do Brasil, brinda-nos com um estudo, em espanhol, sobre os contratos bancários, que foi desenvolvido no âmbito do programa de Doutorado em Direito da Universidade Nacional de Buenos Aires (UBA), na área de advocacia preventiva nas relações de consumo. O autor analisa as peculiaridades desse tipo de relação contratual, identificando as tensões, os conflitos e o impacto da tecnologia sobre a dinâmica das relações entre instituições financeiras e seus clientes.


Em seguida, Maria de Fátima Cavalcante Tosini, Elvira Cruvinel Ferreira Ventura e Luciana Graziela Araújo Cuoco, analistas do Banco Central, investigam de que maneira as políticas de responsabilidade socioambiental dos bancos podem ser indutoras do desenvolvimento sustentável. As autoras contextualizam essas iniciativas no ambiente dos movimentos sociais e ambientais, traçando um histórico do envolvimento dos bancos com tais questões, no Brasil e no mundo.


O tema da justiça social é abordado por Flávio José Roman, Procurador do
Banco Central, que analisa a incidência e a eficácia das normais constitucionais
de justiça social na regulação do sistema financeiro nacional. Após destacar
algumas normas de cunho social firmadas na Carta Magna, o procurador
demonstra sua aplicabilidade com precedentes do Supremo Tribunal Federal e
aborda sua incidência nas leis e normas infralegais de fomento ao microcrédito.


Na busca de bases mais concretas para a solução jurídica de casos práticos,
principalmente em questões de cunho econômico, Leandro Sarai oferece sua
perspectiva acerca do conceito de direito adquirido. Após uma revisão de
literatura acerca do conceito corrente, Leandro propõe algumas bases para
identificar o que de fato atribui a qualidade de “adquirido” a um direito.


Em nova contribuição para a revista, Marlos Lopes Godinho Erling defende o pleno uso do Sistema Bacen Jud, sustentando a ilegalidade e a inconstitucionalidade da imposição, ao exeqüente, por órgãos jurisdicionais, do ônus de demonstração do esgotamento de diligências, de ordem extrajudicial, como requisito para a utilização do referido sistema. Recorrendo ao exame da legislação processual em vigor, Marlos assevera que a penhora de dinheiro teve sua juridicidade reforçada pelas recentes reformas legislativas, sobretudo porque garante a eficácia do direito fundamental à tutela jurisdicional adequada, efetiva e tempestiva, nos termos da Constituição da República, sem que haja violação ao direito fundamental de sigilo bancário.


No plano dos temas internacionais, Guilherme Centenaro Hellwig investiga o papel desempenhado pela defesa e a promoção da concorrência na busca da construção de um ambiente comunitário europeu no qual os agentes econômicos possam se movimentar livremente, em um mercado interno único. O autor examina a importância das autoridades européias na consolidação do mercado bancário único europeu, estudando como o Tribunal de Justiça das Comunidades Européias e a Comissão Européia contribuíram para uma efetiva implementação das regras concorrenciais comunitárias no setor bancário do Velho Continente. Jefferson Siqueira de Brito Alvares trata dos mecanismos de compartilhamento monetário, que, segundo retratado por ele, servem à função de angariar credibilidade à política econômica, mediante a renúncia ao exercício da política monetária pelas autoridades nacionais, além de permitir a redução de custos de transação no comércio internacional associados à existência de padrões monetários diversos.


Por fim, Danilo Takasaki Carvalho apresenta os principais aspectos jurídicos
do Sistema de Pagamentos em Moeda Local (SML), operado pelos bancos centrais
do Brasil e da Argentina desde outubro de 2008. Para tanto, ele examina os textos
normativos editados pelas diversas instituições envolvidas com a criação do
sistema, à luz da literatura jurídica e econômica sobre o assunto e de informações
existentes em processos administrativos arquivados no Banco Central.


Na seção de pronunciamentos, foram selecionados pelo Conselho Editorial
dois pareceres que serviram de base a informações prestadas pelo Banco
Central ao Superior Tribunal de Justiça para julgamento de causas pertinentes
à limitação de juros remuneratórios e comissão de permanência, além de
parecer sobre um projeto de lei que se propõe a fixar critérios para a incidência
de juros progressivos de acordo com o número de recursos interpostos, como
forma de coibir o manejo da via recursal para fins protelatórios. Além disso, são
publicadas duas peças de contestação apresentadas pelo Banco Central em ações
civis públicas, uma buscando a declaração de ilegalidade da cobrança de tarifa
pela emissão de cheques de pequeno valor e outra buscando o reconhecimento
judicial da obrigação do Banco Central de fiscalizar as administradoras de cartão
de crédito.


Brasília, 30 de dezembro de 2008.
Fabiano Jantalia
Editor da Revista da PGBC

Revista da Procuradoria-Geral do Banco Central
v. 2 n. 1 (2008)

A excelência de uma revista somente pode ser assegurada pela qualidade do corpo editorial, do conselho de consultores, dos autores colaboradores e, especialmente, dos resultados que alcança ao angariar apoio e respeito dos seus leitores. No entanto, para a comunidade acadêmica, além desses aspectos, existem procedimentos, critérios e classifi cações que atestam a qualidade dos veículos de divulgação da produção científi ca, técnica e artística por área de circulação. O número 1 do volume 2 da Revista da PGBC introduz algumas alterações formais em relação ao número anterior, para promover sua adequação aos critérios de implantação do Qualis de periódicos da área do Direito, da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), que chancela o padrão de excelência de um periódico acadêmico na área de Direito. Contam-se, dentre tais critérios, a apresentação de palavras-chave e resumos bilíngües antecedendo cada artigo e a publicação de trabalho em idioma estrangeiro.


Para inaugurar essas inovações, com a fi nalidade de contribuir para o debate institucional sobre o papel do Banco Central num ambiente globalizado em que se discute a necessidade de mudanças estratégicas na governança do sistema financeiro internacional, o Conselho Editorial da Revista da PGBC selecionou o trabalho em inglês Social Money, Central Banking and Constitutive Rules of the International Monetary System, de autoria do Doutor Rodney Bruce Hall, Professor de Política Econômica Internacional do Departamento de Desenvolvimento Internacional (Queen Elizabeth House – QEH) e do St. Cross College, ambos da Universidade de Oxford, Inglaterra. O mencionado trabalho foi apresentado na 48a Conferência Anual da Associação de Estudos Internacionais em Chicago, EUA, em 2007, estando prevista sua publicação como terceiro capítulo do livro Central Banking as Global Governance: Constructing Financial Credibility, a ser lançado pela editora Cambridge University Press, da Universidade de Cambridge, Inglaterra.


Em seu estudo, o professor Hall apresenta análise do caráter social da moeda
e do banco central como instituição social utilizando a teoria institucional
para identifi car o ambiente fi nanceiro internacional como uma esfera de fatos
sociais (ou institucionais) rigorosamente distinguível da esfera dos fatos brutos
(ou observacionais). A abordagem da moeda como um fato institucional (uma
promessa), e não como uma commodity ou uma mercadoria, recorre a alguns
conceitos fundamentais: os “fatos institucionais” são gerados pela atribuição
coletiva de “funções de status” a pessoas, instituições e objetos que, dessa
forma, adquirem “poderes deônticos” e autoridade em virtude, unicamente, da
referida atribuição coletiva de funções de status. Em seguida, o autor aplica a
teoria aos poderes deônticos dos bancos centrais que se relacionam com funções
dessas instituições, tais como a criação e a destruição de moeda e a atuação
como emprestador de última instância. Com fundamento em tais premissas, o
professor Hall discute a conveniência de se lançar uma ótica socializada sobre
os sistemas monetários internacionais e sobre a atividade dos bancos centrais.


Tão importantes como a colaboração internacional são os trabalhos elaborados
pelos colegas do Banco Central, consolidando uma tendência emblemática que
foi observada nos textos publicados no primeiro número da Revista da PGBC.
Entre a particularidade das questões jurídicas enfrentadas pela autarquia e a
generalidade da refl exão fi losófi ca, todos os artigos perpassam relevantes temas.


Arício José Menezes Fortes apresenta as obrigações assumidas pelo Brasil em decorrência das convenções internacionais de combate à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo, explicando as Recomendações do Grupo de Ação Financeira (Gafi ) e comentando a atuação do Conselho Monetário Nacional (CMN) e do Banco Central do Brasil no que se refere à matéria. Lucas Alves Freire examina a possibilidade de o Banco Central do Brasil adotar, no bojo de processos administrativos, medidas cautelares contra pessoas e instituições submetidas à sua fiscalização, respondendo, de modo claro, questões que foram apresentadas pela área técnica da autarquia sobre a utilização do instituto,discutindo diversos aspectos potencialmente controversos presentes na norma em exame e procurando alcançar orientação jurídica capaz de assegurar que o administrador público, quando venha a se valer da tutela acautelatória prevista no art. 9º da Lei nº 9.447, de 14 de março de 1997, atue dentro dos estreitos limites da legalidade.Lademir Gomes da Rocha trata das particularidades da aplicação do Código de Defesa do Consumidor (CDC) ao sistema contratual dos consórcios e sustenta ser necessário distinguir os contratos bilaterais, formados entre a administradora e os participantes dos grupos de consórcio, do contrato plurilateral, que, a partir da constituição dos grupos, vincula os consorciados entre si. Marden Marques Soares e Elvira Cruvinel Ferreira Ventura analisam a dinâmica de funcionamento do conselho de administração das cooperativas de crédito no Brasil e defendem o argumento de que, para boa governança, as atividades de execução devem ser exercidas por diretoria estatutária profissional – diretoria executiva –, integrada ou não por associados, porém sempre independente do conselho de administração, de forma a retornar esse órgão ao papel de responsável pela condução estratégica da sociedade. Marlos Lopes Godinho Erling examina a responsabilidade por omissão do auditor externo no âmbito do Sistema Financeiro Nacional (SFN), tendo em vista que sua função de atestar a idoneidade e a veracidade das informações contábeis, financeiras e patrimoniais de instituições fi nanceiras e outras instituições autorizadas a funcionar pela autarquia é fundamental para o funcionamento adequado do SFN. Alberto André Barreto Martins trata das controvérsias que envolvem o uso da taxa Selic na aplicação do art. 406 do Código Civil brasileiro e da atual sistemática legal de limitação das taxas de juros, adotando como referência decisões dos tribunais superiores e opiniões encontradas na doutrina nacional. Rafael Lovato analisa a Teoria Maior da desconsideração da personalidade jurídica, apresentando tese sobre a Teoria Menor, muito mais complexa e abrangente do que a Maior e de mais difícil sistematização e aplicação, tema que ganhou mais visibilidade e importância no Brasil com a promulgação do novo Código Civil.


Por último, ao publicar alguns dos seus pronunciamentos, a Procuradoria-Geral tem a oportunidade de compartilhar com a sociedade o conhecimento jurídico que produz sobre complexas questões situadas no âmbito das competências do Banco Central do Brasil. Para esta edição, foram selecionadas peças que versam sobre os seguintes assuntos: a) constitucionalidade e legalidade do ato normativo instituidor e das demais normas disciplinadoras do Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional         (Proer); b) ilegalidade e inconstitucionalidade de atos do Tribunal de Contas da União que tenham por fi nalidade assegurar o acesso irrestrito e indiscriminado daquela Corte de Contas às informações protegidas pelo sigilo bancário; c) constitucionalidade do artigo 5º, caput e parágrafo único, da Medida Provisória nº 2.170-36, de 23 de agosto de 2001, publicada no DOU de 24 de agosto de 2001, que autoriza a capitalização de juros em período inferior a um ano nas operações realizadas pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional. d) análise da viabilidade jurídica da criação de órgãos de administração de natureza estatutária cujos membros sejam escolhidos pelo conselho de administração nas cooperativas de crédito; e) legalidade de multa administrativa aplicada pelo Banco Central com base na Lei nº 9.817, de 23 de agosto de 1999, posteriormente revogada pela Lei nº10.755, de 3 de novembro de 2003.



Brasília, 30 de junho de 2008.
Marusa Freire
Diretora da Revista da PGBC e Coordenadora-Geral do Centro de
Estudos Jurídicos da Procuradoria-Geral.

Revista da Procuradoria-Geral do Banco Central
v. 1 n. 1 (2007)

Durante muito tempo, foi aceito o ponto de vista de que a formulação e a administração da política econômica deveriam ser matérias entregues exclusivamente a tecnocratas, apoiados na expertise técnica de especialistas formados em Economia. O campo disciplinar da Economia era visto como a fonte principal – e, em tese, suficiente – de conhecimentos dos quais seria possível derivar as prescrições formativas da política econômica e dos procedimentos de sua implementação.


Contudo, hoje, cresce o consenso em torno da idéia de que a perspectiva econômica necessita ser complementada com outras perspectivas disciplinares e ser combinada, em especial, com a análise jurídica. Isso deriva da percepção de que os mercados – financeiros, de trabalho, de commodities, de bens de consumo e tantos outros – têm uma estrutura institucional complexa e em transformação constante. A dinâmica de transformações institucionais ocorre a partir das ações e estratégias de grupos de interesse, decisões de autoridades, oscilações da opinião pública, especulações, guerras e dos impactos oriundos de avanços tecnológicos.


Além disso, a estrutura institucional dos mercados e as mudanças a que ela está sujeita adquirem formas jurídicas (abrangendo a existência e a supressão de direitos, titularidades, deveres e referenciais normativos) que são objeto e
meio de deliberação de autoridades públicas, ao mesmo tempo em que oferecem motivações para a formação de planos de ação política (o reposicionamento de grupos e suas reivindicações diante de outros grupos e diante do Estado) e de ação econômica local e internacional.


Dada essa nova percepção, torna-se clara a necessidade de se articularem intelectual e tecnicamente a formulação e a administração da política econômica com a análise jurídica. É essa análise que é capaz de estimar ou avaliar criticamente a formação de consensos especializados, ou contestar a sua prevalência, a respeito de sentidos produzidos em torno de inúmeros referenciais normativos, relevantes para a estruturação e implementação da política econômica.


Contudo, dito isso, cabe imediatamente registrar uma dificuldade: se é possível sustentar que o lado fiscal da política econômica tem conexões nítidas com o Direito, em virtude da existência de doutrinas jurídicas robustas e historicamente sedimentadas, atinentes aos tributos e à administração do sistema tributário, o mesmo não pode ser dito a respeito do lado monetário e financeiro da política econômica, incluindo a instituição e a defesa interna e externa da moeda, a organização dos meios de pagamento, as políticas de crédito, a cooperação monetária internacional, entre outras.


Nesse sentido, é mais do que bem-vinda a publicação, que agora vem a lume, sob a forma da Revista da Procuradoria-Geral do Banco Central. Em seu primeiro número, a Revista já oferece instigantes e informativos estudos e pareceres jurídicos sobre temas de grande relevância para a administração da política monetária e para o exercício da supervisão bancária. E é significativo que tenha feito parte do impulso inicial para a criação desse periódico jurídico a realização do I Curso de Pós-Graduação (Lato sensu) em “Direito Econômico da Regulação
Financeira”, ocorrido entre outubro de 2004 e abril de 2006, em parceria entre o Banco Central do Brasil e a Faculdade de Direito da Universidade de Brasília, cuja coordenação acadêmica tive a especial satisfação de exercer.


A perspectiva acadêmica interdisciplinar pôde ressaltar argumentos que evidenciam o caráter imprescindível do trabalho jurídico para que a política econômica se torne uma realidade institucional na democracia brasileira, hoje imersa em um mundo de estabilidades efêmeras, em parte decorrentes do acirramento da competição econômica internacional. Nesse mundo, a eficiência não equivale à suficiência. Com efeito, de um modo geral, uma economia pode ser eficiente e, ao mesmo tempo, injusta. Neste último caso, a tendência é que, no longo prazo, a competitividade, minada pelo sub-emprego e pela desigualdade, saia perdendo. Aceitar isso, no passado, pôde fazer parte de grandes pactos políticos, por parte de quem deles se beneficiava. Porém, foi-se o tempo da Guerra Fria, em que a existência dessas economias (injustas) era absorvida na geopolítica da bipolaridade. Uma economia dinâmica e efetivamente competitiva, no mundo contemporâneo, necessita aliar a eficiência econômica à promoção da justiça.


A Revista da PGBC, que agora é oferecida ao público, sem dúvida contribui para a promoção dessa aliança, promissora e benfazeja, no campo das atribuições do Banco Central do Brasil.



Brasília, 11 de dezembro de 2007.
Professor Marcus Faro de Castro
Diretor da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília